A Assembleia Geral da Federação
Portuguesa de Atletismo marcada para este sábado prepara-se para tratar
assuntos constantes de uma convocatória de que consta a «aprovação da inclusão
do Campeonato Nacional de Marcha em Estrada de 35 km no calendário nacional». A
ideia de validar a integração de um campeonato de 35 km marcha no calendário
nacional de atletismo já vinha do início de 2016, momento em que a FPA divulgou
a realização de um campeonato da distância, «pendente de aprovação em próxima
Assembleia Geral da FPA e inclusão futura no calendário regular deste
Campeonato».
Quando em 2014/2015 a FPA decidiu
pôr termo aos campeonatos de 50 km marcha, voltando depois atrás quando a
generalidade dos marchadores fez sentir a insensatez dessa decisão, a direcção
da federação pôs em andamento um plano para impor o campeonato de 35 km,
fazendo de conta que não acabava com o de 50 km.
Ao que se sabe, e sem que tenha sido
remetido às associações distritais qualquer documento a justificar esta
proposta, é preciso que se entenda (o que a direcção da federação não quis
explicar) que a aprovação dos campeonatos de 35 km significará o fim formal dos
campeonatos da distância oficial e olímpica de 50 km em Portugal, pois não
existe espaço nem mesmo se justifica a existência de dois campeonatos (35 e 50
km).
De uma forma habilidosa e
encapuzada, a direção da FPA transfere a responsabilidade para as associações
distritais ao querer que estas aprovem um campeonato nacional de uma distância
sem qualquer nexo para substituir uma do programa olímpico, algo que assume
traços de escândalo como nunca antes sucedeu na marcha atlética em Portugal.
E faz incluir este ponto na ordem de
trabalhos sem fornecer qualquer material para reflexão prévia, na expectativa
de que ninguém levante questões e o assunto passe sem discussão. Mas cabe
perguntar: assim, as associações vão votar o quê? Se não tiveram oportunidade
de reflectir acerca do assunto (pela já referida falta de documentos de
sustentação da proposta), como podem participar numa votação? Ou será que o
ponto vai ser considerado aprovado sem recurso a votos?
Os menos atentos ao assunto, ou a
quem a disciplina da marcha pouco diga, são levados a concluir que a intenção
federativa é benéfica e que pretende fazer com que participem mais atletas numa
distância inferior. Mas é sabido (e a prática confirma) que o setor técnico
específico de marcha na FPA e o treinador nacional de marcha nada fizeram para
promover e apoiar os atletas da distância de 50 km. Antes pelo contrário,
optaram pela eliminação pura e simples do respectivo campeonato – da mesma
maneira que já tinham «eliminado» a possibilidade de esses atletas tomarem
parte em grandes competições internacionais, como sucedeu nas mais recentes
edições das taças do mundo e da Europa de marcha, com casos como aquele em que
à última hora foram alteradas as marcas de referência para graus de exigência
inalcançáveis.
Acaso se eliminaria o campeonato
nacional da maratona ou se reduziria a mítica distância dos 42,195 km para 40
km, ou 38 km ou qualquer outra? É por si só o número de atletas participantes
que justifica a extinção de campeonatos de disciplinas sejam elas quais forem?
Exemplos há vários, na pista e em estrada, de provas que têm muito poucos
participantes e nem por isso deixam de fazer parte dos programas dos
campeonatos nacionais ou de Portugal. E se a FPA fosse coerente com as suas
propostas, também teria de submeter à discussão e votação propostas para
eliminação dessas provas dos campeonatos de que fazem parte.
Por muito que se aponte a solução
dos 35 km como servindo para preparar uma futura retoma dos campeonatos de 50
km, a verdade é que nunca os 50 km voltarão a ter campeonatos nacionais em
Portugal se não forem tomadas medidas de incentivo a essa distância olímpica.
Ou seja, é desculpa de mau pagador (ou mesmo hipocrisia) pretender justificar a
existência do campeonato de 35 km como um pretenso benefício futuro nos 50 km.
Tudo isto surge ao contrário da
tendência internacional, que, como se sabe, vai no sentido de alargar a distância
longa ao sector feminino, e não para o lado do empobrecimento do sector
masculino. Ainda para mais, este processo desenvolve-se também no momento em
que nada menos que três atletas portugueses têm mínimos olímpicos precisamente
nos 50 km marcha. Se esses atletas um dia quiserem voltar a fazer mínimos para
os Jogos Olímpicos ou para campeonatos mundiais ou europeus, de certeza não
será nuns campeonatos de 35 km que vão procurá-los.
A última palavra é agora das
associações distritais, assim se sintam aptas a debater o tema e preparadas
para votar.