|
A partida dos 35 km masculinos em Eugene, Oregon, a emocionante chegada e os atletas do pódio, Perseus Karlström (3.º), Massimo Stano (1.º) e Masatora Kawano (2.º). Imagens: World Athletics. Montagem: O Marchador |
O italiano Massimo Stano venceu este domingo os 35 km marcha masculinos dos mundiais de Eugene, concluindo uma prova emocionante em 2.23.14 h. O transalpino manteve até aos últimos metros uma luta intensa com os melhores companheiros de prova, acabando por impor-se na volta final ao japonês Masatora Kawano (2.23.15), depois de ter-se desfeito da companhia do sueco Perseus Karlström, terceiro com 2.23.44 h.
Apesar do brilhantismo do desempenho dos medalhados, foi para outro atleta japonês o protagonismo da primeira metade da prova. Daisuke Matsunaga surpreendeu todo o pelotão com uma partida-relâmpago, impondo ritmo elevadíssimo e ganhando vantagem crescente nas primeiras voltas ao circuito de mil metros no Martin Luther King Jr Boulevard. Os 3.59 minutos do primeiro quilómetro demonstram o empenho que o nipónico pôs nesta fase da competição, mantendo-se em ritmo pouco acima dos quatro minutos nas voltas seguintes e ainda repetindo os 3.59 m no quinto quilómetro.
No final da primeira légua, Matsunaga registava 20.14 m, com 48 segundos de vantagem sobre o primeiro grupo, composto por 13 unidades. A situação manter-se-ia em termos semelhantes até aos dez quilómetros, passados pelo japonês em 40.38 m, ainda que com uma vantagem já a crescer menos: 52 segundos para o grupo perseguidor, agora com oito integrantes: Perseus Karlström, José Luis Doctor (México), Xianghong He (China), Miguel Ángel López (Espanha), Massimo Stano, Ricardo Ortiz (México), Eider Arévalo (Colômbia) e Masatora Kawano.
A terceira légua seria a mais equilibrada entre o líder e os perseguidores, com a vantagem de Matsunaga a manter-se por volta dos 50 segundos. No entanto, a transição da primeira para a segunda metade da prova (dos 15 aos 20 km) foi marcante do declínio do fugitivo, cujo impulso inicial se revelou estratégia errada para as intenções de Matsunaga. Com a falência do ritmo do nipónico e a aceleração do primeiro pelotão, a vantagem de Matsunaga foi diminuindo até que o grupo perseguidor o alcançou perto da passagem aos 21 quilómetros. Entretanto, o japonês ainda passara à frente aos 20 quilómetros, com 1.22.33 h, tempo que lhe teria dado o 15.º lugar nos 20 km destes mesmos mundiais, uma semana atrás.
Nova fase da competição, novos protagonistas. Entrava agora em cena um atleta que vinha fazendo uma prova discreta, juntando-se ao grupo da frente quase no mesmo momento em que Matsunaga era alcançado. Tratava-se de Brian Daniel Pintado, do Equador, quinto classificado nos 20 km da semana passada e que aqui procurava melhorar essa classificação.
Pintado, He e Stano eram os atletas em maior destaque na liderança desta fase da prova, levando a que o grupo se fosse reduzindo à medida que os quilómetros iam passando. Aos 25 quilómetros, o pelotão da frente já incluía apenas sete atletas, reduzidos a cinco no final de trinta voltas: Pintado, Kawano, Stano, He e Karlström.
O chinês cederia logo a seguir e Brian Pintado faria o mesmo pouco antes da passagem aos 32 quilómetros. Ficava assim definida a composição do pódio, faltando saber que medalhas conquistariam Kawano, Stano e Karlström.
Com o italiano a forçar na liderança e produzindo ataques sucessivos, Perseus Karlström pareceu contentar-se com a medalha de bronze e, pouco antes dos 33 quilómetros, deixou a luta pela vitória para o italiano e o japonês.
Com as duas voltas finais abaixo dos quatro minutos por quilómetro (3.54 + 3.50), Stano e Kawano foram aos limites na luta pela medalha de ouro. Ligeiramente atrasado do italiano, Masatora Kawano recebeu mesmo dois avisos dos juízes de marcha com o intervalo de apenas um minuto. Mesmo assim, ainda voltou a chegar-se a Massimo Stano, mas o italiano seguraria o primeiro lugar, com apenas duas passadas de avanço sobre o japonês.
Mais atrás, Karlström garantia o terceiro lugar, enquanto Pintado e He concluíam nos lugares imediatos. O canadiano Evan Dunfee, terceiro nos 50 km dos Jogos Olímpicos de Tóquio, há um ano, e nos mundiais de Doha, em 2019, conseguiu chegar à sexta posição, recuperando na parte final de uma prova em que nunca andou pelo grupo da frente.
Nota ainda para o sétimo lugar de Caio Bonfim (Brasil, 2.25.14) e para o oitavo de Arévalo (2.25.21), que, apesar de tudo, não cedeu muito depois de ter perdido o contacto com a liderança, ao contrário de Matsunaga, que, depois de ganhar um minuto na frente nos primeiros quilómetros, perdeu mais de dez na parte final.
Num momento em que ainda não existe recorde mundial reconhecido para esta distância «nova» do programa de marcha das grandes competições internacionais, assinale-se a obtenção de nada menos que cinco recordes de área (Europa, Ásia, América do Sul, América do Norte e África) e 17 recordes nacionais.
Entre os portugueses, João Vieira e Rui Coelho tiveram (como era de esperar, de resto, mas em termos menos previsíveis) desempenhos distintos. O multimedalhado marchador em europeus e mundiais de atletismo, atualmente com 46 anos e na sua 12.º participação em campeonatos do mundo, teve um início cauteloso, mantendo-se num grupo mais atrasado. No entanto, acabaria por desistir sensivelmente a meio. Quanto a Rui Coelho, a caminho de fazer 28 anos, brindaria esta presença em Eugene com uma melhor marca do ano (por 2 segundos), registando 2.44.55 h, correspondente ao 39.º lugar.
Chegam, assim, ao final os mundiais de atletismo de 2022 no que à marcha diz respeito, devendo agora aprofundar-se a reflexão sobre a decisão de substituir as provas de 50 km pelas de 35 km (masculinos e femininos) agora estreadas em campeonatos do mundo individuais. Será esta uma distância útil? Não estaremos perante uma «variação» relativamente à distância de 20 km? Ou será que, em matéria de marcha atlética, nos esperam para Jogos Olímpicos e campeonatos mundiais mais decisões bizarras, descaracterizadoras da disciplina?
As respostas deverão chegar em breve mas, tendo em conta os protagonistas das decisões em questão (federação internacional ou, como agora se lhe chama, World Athletics, que é uma designação que pode funcionar na língua inglesa mas não noutros idiomas), não se prevê nada de bom. Apenas a continuação da transformação de uma histórica disciplina do atletismo numa espécie de caixa de ressonância de modelos que podem ter cabimento noutros contextos (entenda-se: noutras modalidades, como o automobilismo ou o ténis) mas não servem à marcha atlética.
Classificação
35 km masculinos
1.º, Massimo Stano, 1992 (ITA - Itália), 2:23:14
2.º, Masatora Kawano, 1998 (JPN - Japão), 2:23:15
3.º, Perseus Karlström, 1990 (SWE - Suécia), 2:23:44
4.º, Brian Daniel Pintado, 1995 (ECU - Equador), 2:24:37
5.º, Xianghong He, 1998 (CHN - China), 2:24:45
6.º, Evan Dunfee, 1990 (CAN - Canadá), 2:25:02
7.º, Caio Bonfim, 1991 (BRA - Brasil), 2:25:14
8.º, Eider Arévalo, 1993 (COL - Colômbia), 2:25:21
9.º, Tomohiro Noda, 1996 (JPN - Japão), 2:25:29
10.º, Miguel Ángel López, 1988 (ESP - Espanha), 2:25:58
11.º, Ricardo Ortiz, 1995 (MEX - México), 2:27:11
12.º, Ever Jair Palma Olivares, 1992 (MEX - Mé), 2:27:55
13.º, Aleksi Ojala, 1992 (FIN - Finlândia), 2:28:22
14.º, Aurelien Quinion, 1993 (FRA - França), 2:28:46
15.º, Yangben Zhaxi, 1996 (CHN - China), 2:28:56
16.º, César Augusto Rodríguez, 1997 (PER - Peru), 2:29:24
17.º, Hao Xu, 1999 (CHN - China), 2:29:55
18.º, Rhydian Cowley, 1991 (AUS - Austrália), 2:30:34
19.º, Dawid Tomala, 1989 (POL - Polónia), 2:30:47
20.º, Wayne Snyman, 1985 (RSA - África do Sul), 2:31:15
21.º, Miroslav Úradník, 1996 (SVK - Eslováquia), 2:31:16
22.º, José Luis Doctor, 1996 (MEX - México), 2:32:43 p.z.
23.º, Vít Hlaváč, 1997 (CZE - República Checa), 2:32:50
24.º, Andrés Chocho, 1983 (ECU - Equador), 2:33:28
25.º, Brendan Boyce, 1986 (IRL - Irlanda), 2:33:31
26.º, Daisuke Matsunaga, 1995 (JPN - Japão), 2:33:56
27.º, Marius Žiūkas, 1985 (LTU - Lituânia), 2:34:16
28.º, Diego Pinzon, 1985 (COL - Colômbia), 2:34:26
29.º, Alexandros Papamichail, 1988 (GRE - Grécia), 2:34:48
30.º, Érick Bernabé Barrondo, 1991 (GUA - Guatemala), 2:35:01
31.º, Dominik Černý, 1997 (SVK - Eslováquia), 2:35:39
32.º, Álvaro López, 1999 (ESP - Espanha), 2:36:20
33.º, Artur Mastianica, 1992 (LTU - Lituânia), 2:36:25
34.º, Karl Junghannß, 1996 (GER - Alemanha), 2:38:50
35.º, Georgiy Sheiko, 1989 (KAZ - Casaquistão), 2:39:47
36.º, Nick Christie, 1991 (USA - E.U. América), 2:41:08
37.º, Arnis Rumbenieks, 1988 (LAT - Letónia), 2:42:47
38.º, Marius Iulian Cocioran, 1983 (ROU - Roménia), 2:43:27
39.º, Rui Coelho, 1994 (POR - Portugal), 2:44:55
40.º, Carl Dohmann, 1990 (GER - Alemanha), 2:45:44
Desistentes: Jhonatan Javier Amoros Carua, 1998 (ECU - Equador), Luis Henry Campos, 1995 (PER - Peru), Carl Gibbons, 1996 (AUS - Austrália), José Montana, 1992 (COL - Colômbia) e João Vieira, 1976 (POR - Portugal).
Desclassificados: Andrea Agrusti, 1995 (ITA - Itália), Artur Brzozowski, 1985 (POL - Polónia), Veli-Matti Partanen, 1991 (FIN - Finlândia), Luis Angel Sanchez Pérez, 1993 (GUA - Guatemala) e Marc Tur, 1994 (ESP - Espanha).