Foto: Schaatsen |
A luta
contra a dopagem conheceu em 2014 alguns desenvolvimentos muito interessantes
no que se refere à marcha atlética. Por um lado foi a sucessão de casos de
análises positivas e de detecção de anomalias nos passaportes biológicos de
atletas (sobretudo russos) que se viram desapossados de galardões e de marcas e
que acabaram a cumprir penas de suspensão. Por outro lado foi o desenvolvimento
de processos judiciais em Itália que, apesar de não terem ainda resultado em
veredictos, não deixaram de lançar um pouco mais de luz sobre algumas «relações
perigosas» estabelecidas entre diferentes agentes do nosso desporto.
Tanto nos
casos verificados na Rússia como nos de Itália, o envolvimento não foi apenas
de atletas, mas também de treinadores, dirigentes e outros intervenientes no
processo de treino e de competição. Deve, no entanto, ficar claro que há
diferenças muito relevantes nuns casos e noutros, sobretudo em matéria de
facto: há processos já concluídos e com aplicação de sanções e há casos que
permanecem em análise (ou julgamento), não tendo por isso havido incriminação
seja de quem for. Em todo o caso e considerando o que está à vista, muita gente
com responsabilidades na organização do desporto sabia de várias situações no
mínimo suspeitas, mas todos (ou quase todos) calavam o que sabiam e permitiam a
«marosca».
É claro que
este não é um problema apenas da marcha atlética. Muito longe disso! E se neste
blogue se dá relevo aos problemas da dopagem associados à marcha é pela simples
razão de que este é um espaço dedicado apenas a esta modalidade desportiva. Mas
tal facto não impede que se reconheça como muito triste a revelação dos casos
de falta de verdade de alguns resultados e os atentados cometidos contra a
saúde de atletas, ao mesmo tempo que nos regozijamos com a capacidade
demonstrada por algumas entidades para apanhar batoteiros.
O sistema
parece funcionar, mas... sabe-se lá quantos prevaricadores continuam a escapar.
Provavelmente não é exagero imaginar que continuam a ser mais os casos não
apanhados do que os descobertos. Além disso, continua a não se perceber por que
razão o sistema parece estar a funcionar bem (ou menos mal) em alguns países
(poucos) enquanto dos restantes parece não haver notícia de grande empenho com
vista a campanhas eficazes de investigação.
Assinala-se
a estranheza pelo facto de quase todos os casos de dopagem entre marchadores
conhecidos em 2014 reportarem a um único país, a Rússia (e em especial à escola
de Saransk), e sublinha-se a urgência de medidas mais eficientes no combate ao
«doping». Mas quem acompanha a realidade da marcha atlética para lá dos
relatórios oficiais e de vez em quando passa, por exemplo, pelas redes sociais
não pode deixar de suspeitar de algumas estranhas relações entre atletas,
ex-atletas, treinadores, políticos, dirigentes, juízes e familiares, todos a
suscitarem dúvidas sobre a benevolência ou as aparentes boas intenções de
certos agentes, muito para lá dos casos mais espectaculares a que pudemos
assistir nos últimos meses.
Seja com o
for, os casos tornados públicos ao longo do ano que agora termina fazem do
combate à dopagem o acontecimento internacional de 2014, mesmo que, na verdade,
não se trate de um acontecimento mas de uma série de acontecimentos (ou de
casos).