Fotograma do documentário «Wie Russland seine Sieger macht», emitido quarta-feita pela ARD. |
Um documentário emitido esta quarta-feira pelo primeiro canal da televisão
pública alemã ARD garante que a Rússia mantém um sistema organizado de dopagem
sistemática e que 99 por cento dos atletas internacionais são dopados. O
programa, com o título «Wie Russland seine Sieger macht» («Como a Rússia produz
os seus campeões»), afirma que há dirigentes da Federação Russa de Atletismo a
serem pagos para fornecerem substâncias proibidas e a aceitarem subornos para
encobrirem casos de testes positivos.
As acusações envolvem ainda a Associação Internacional de Federações de
Atletismo (AIFA) no processo de encobrimento dos casos detectados. No entanto,
a AIFA e a Agência Mundial Antidopagem garantem que irão prestar atenção às
acusações, enquanto a federação russa considera falsas as acusações.
Uma das atletas ouvidas no documentário da autoria de Hajo Seppelt é a
antiga lançadora de disco Evgeniya Pecherina, que afirma serem as substâncias
proibidas usadas por uma maioria de 99 por cento dos atletas internacionais
russos. «Consegue-se obter seja o que for que o atleta queira», afirma a atleta
de 25 anos, actualmente a cumprir uma suspensão de 10 anos, depois de uma
primeira punição de dois anos, em 2011.
Também a fundista Liliya Shobukhova, vencedora da maratona de Londres de
2010, faz revelações importantes no programa, admitindo ter pago o equivalente
a 450 mil euros à Federação Russa de Atletismo para que não fosse divulgada uma
análise positiva.
O programa transmitido na televisão alemã surge num momento em que a marcha
atlética russa tem sido abalada por sucessivos casos de suspensão de atletas
devido a análises positivas de «doping» ou a desconformidades nos respectivos
passaportes biológicos. De resto, tanto por imagens como por história contada,
a marcha não deixou de ser referida (ainda que indirectamente) neste
documentário.
Recorde-se ainda que, recentemente, o ministro russo do Desporto, Vitaliy
Mutko, defendeu em entrevista o trabalho desenvolvido no Centro de Preparação
Olímpica de Saransk, de onde são oriundos mais de uma dúzia de marchadores
sancionados por dopagem nos últimos dois anos. Na mesma ocasião, o governante
elogiou o talento de Viktor Chyogin, o treinador responsável pela orientação
técnica desses atletas, dando a entender que o problema não estava nos métodos
utilizados no centro de treino mas na competência com que esses métodos eram
postos em prática.
Para além da importância das revelações feitas no programa, importa ter em
conta a situação política e militar vivida actualmente no leste europeu, a que
parece corresponder a escalada de uma segunda guerra fria. No passado, o
confronto leste-oeste teve no desporto um importante cenário de confrontos, não
apenas no plano competitivo mas também na domínio das acusações recíprocas em matéria
de dopagem.
Aliás, seria por certo muito interessante a realização de documentários
sobre a mesma temática noutros países, o que haveria de resultar em revelações
se calhar não menos espantosas. Tenha-se em conta as recentes descobertas de
que ao «doping» de estado na RDA, largamente denunciado após a queda do muro de
Berlim, correspondia, afinal, um procedimento semelhante na RFA.
O documentário (em alemão) pode ser visto aqui.