Marchadores portugueses em Moscovo: João Vieira, Ana Cabecinha, Inês Henriques, Vera Santos, Pedro Isidro e Sérgio Vieira. Fotos: IAAF e Jeff Salvage. Montagem: O Marchador. |
O comentário parece
simpático para a marcha e os marchadores. Tantas vezes relegados para terceiros
planos informativos, mesmo quando aconteceram alguns dos maiores sucessos
competitivos internacionais, os marchadores sentem por certo a alegria do
reconhecimento público das suas qualidades e do resultado do esforço de anos de
treino. Mas desenganem-se os que não «topam» para lá do evidente. Ainda que
haja vários níveis de leitura daquelas palavras do jornalista de «A Bola», não
se pode, por um lado, desconsiderar o esforço de todos os que, não sendo
marchadores nem lhe estando ligados por qualquer função, todos os dias se
empenham em que o atletismo seja uma realidade múltipla, e, por outro lado, esquecer
que grandes atletas, com irrefutáveis provas dadas, tentaram até ao último
momento e em condições de desvantagem obter os mínimos de participação nos
mundiais em disciplinas que não a marcha atlética (e nem o facto de não os
terem conseguido diminui a sua importância no atletismo português e mundial).
Portanto, há mais atletismo para além da marcha.
O problema é que a
marcha portuguesa continua a não ter profundidade. Inebriados por sucessos
individuais ou colectivos registados nos últimos anos (para alegria de todos,
mas só alguns acautelados na não criação de expectativas irrealistas), muitos
têm pensado que o nosso país já é uma potência mundial da marcha. Mas as
potências são outra coisa. São aqueles países que colocam dez ou quinze atletas
nos vinte ou trinta primeiros das listas mundiais de cada ano das diferentes
distâncias olímpicas. E dominam em quantidade e qualidade nos diferentes
escalões etários. E têm uma taxa de participação desportiva que revela
verdadeiro envolvimento da sociedade no desporto. Isso, sim, são as grandes
potências da marcha (e do desporto).
Em Portugal, alguns
casos excepcionais, felizmente em quantidade superior ao que a qualidade
organizativa poderia fazer supor, deram a ilusão de que estávamos entre os
melhores dos melhores. Mas a dura realidade (do passado e do presente, mas
previsivelmente também do futuro) é que depois de uma vanguarda de grande valor
não se constituiu uma retaguarda que servisse de alternativa ou de possível
reserva em caso de necessidade. Como já se nota sobretudo no sector masculino,
Portugal tem alta qualidade mas baixa quantidade (ou baixa densidade). Há
jovens a prometer bons níveis competitivos futuros, mas na maior parte dos
casos ainda estão longe do topo, são em quantidade exígua e não se encontram
enquadrados por qualquer projecto central de desenvolvimento da marcha, que vá
além do empenho associativo dos respectivos clubes e da abnegação dos
treinadores.