quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Marcha em Portugal na Primavera de 1938 (V)

Manuel Guerreiro durante a prova de 25 km marcha em Lisboa,
onde já tinha revelado boas qualidades. Foto: Arquivo DN
A prova de marcha de 25 km que o jornal «Os Sports» levou a efeito em Lisboa no dia 10 de Abril de 1938 foi divulgada durante semanas nas páginas do próprio jornal e do «Diário de Notícias» e visava fazer renascer em Portugal a prática dessa modalidade desportiva, esquecida havia muitos anos. Tratava-se, portanto, de uma prova com que «Os Sports» afirmavam desejar inspirar o surgimento de outras competições da especialidade.

Para além da elevada quantidade de inscritos e de participantes na competição de 10 de Abril, o sucesso do evento teve nova expressão no interesse manifestado por outras entidades de levar a efeito mais provas de marcha. E a primeira a ser divulgada partia de uma iniciativa do Secil Football Clube, agremiação dos trabalhadores da cimenteira Secil de Outão, junto a Setúbal. A prova foi marcada para 8 de Maio e inscrevia-se no programa dos festejos do aniversário do clube organizador.

«Os Sports» trataram de ajudar a divulgar o evento, forma aliás de também valorizar ainda mais a iniciativa que o próprio jornal levara por diante. Na edição de 27 de Abril dizia-se que a prova setubalense teria a extensão de 20 quilómetros, sobre um percurso com partida e chegada em Outão e passagem por Setúbal. Uma semana depois, no jornal de 2 de Maio, já era possível especificar a volta que os marchadores teriam de dar. Partiriam do campo de jogos do Secil F.C., seguiriam pela Estrada da Rasca, Comenda, Saboaria, Avenida Todi (lado sul, passando frente ao Quartel de Infantaria 11), Fontainhas, Rua Camilo Castelo Branco, Quatro Caminhos, Bairro Baptista, Avenida Portela, Rua Garrett, Parte do Bonfim (por trás da capela), Estrada da Algodeia, Ferro de Engomar, Rio de Figueira, Bairro Alves, Avenida dos Combatentes da Grande Guerra, Avenida Todi (lado norte), regressando em sentido inverso ao inicial: Saboaria, Comenda, Estrada da Rasca e meta no campo de jogos.

De caminho indicava-se alguma quilometragem intermédia: cinco quilómetros até Setúbal; 7,5 km no Bairro Vitorino (antes dos Quatro Caminhos); 10 km na Estrada da Algodeia; 12,5 km na Estrada do Rio de Figueira; 15 km na Av. Todi (norte).

Na última tiragem antes do dia da prova, edição de 6 de Maio, o jornal acrescentava uma pitada de sal ao interesse pelo evento de Setúbal ao divulgar que entre os inscritos se encontravam Manuel Guerreiro e Alberto de Sousa, as figuras que tinham estado em maior destaque na prova de 10 de Abril, em Lisboa.

Chega então a informação sobre o decurso da competição, com uma breve reportagem publicada na segunda-feira, 9 de Maio, com um título que dizia quase tudo: «Manuel Guerreiro ganhou a prova de marcha em 1 h. 58 m. 20 s». Ficava logo aí referido o que o texto depois explicava um pouco.

«Manuel Guerreiro, que na prova de marcha de 'Os Sports' havia deixado excelente impressão, apesar de se haver classificado em quarto lugar, desforrou-se agora, batendo os melhores da popular competição organizada pelo nosso jornal.

Na marcha de 'Os Sports' Guerreiro chegou a ter grande avanço, mas um desfalecimento no final da prova fez-lhe perder o lugar que parecia já conquistado.

Ontem, Manuel Guerreiro soube conduzir melhor o seu esforço e acabou por triunfar, confirmando as belas qualidades demonstradas na prova de 'Os Sports'. Bateu o vencedor da competição organizada pelo nosso jornal, Alberto de Sousa e bateu Ernesto Freitas e Armando Gonçalves, classificados em 2.º e 3.º lugares.»

Como pode verificar-se, o apontamento do repórter tem mais preocupação em comparar o resultado desta competição com o da prova que o seu jornal tinha organizado semanas antes do que propriamente em relatar a prova setubalense. De qualquer forma, ficava claro que Manuel Guerreiro se afirmava como, provavelmente, o melhor marchador a competir em Portugal nessa época. Não havendo comparações possíveis por escassez de provas, a vitória em Setúbal e o bom desempenho em Lisboa um mês antes eram bons indícios da capacidade do atleta do Secil Football Clube.

Pela notícia ficava-se a saber também que tinham alinhado 43 concorrentes na partida em Outão, 38 dos quais conseguiriam concluir a prova. A classificação dos dez primeiros foi a seguinte:

1.º, Manuel Guerreiro (Secil), 1.58.20
2.º, Ernesto Freitas (Raio), 2.02.30
3.º, Alberto Pereira (Alto Pina), 2.03
4.º, Amílcar Pereira (S. Domingos), 2.03.15
5.º, Mário Jesus (S. Domingos), 2.03.50
6.º, Floro Sousa (S. Domingos), 2.04
7.º, Joaquim Alvarez (Sporting), 2.04.20
8.º, Armando Gonçalves (Sete Rios), 2.04.35
9.º, Alberto de Sousa (Raio), 2.05
10.º, Manuel Baptista (S. Domingos), 2.05.30

A escassez de rigor que parece transparecer do aparente arredondamento das marcas transpostas para a classificação não impediu o sucesso da iniciativa do Secil F.C., facto que poderia ajudar ao desenvolvimento da modalidade na região e até no país. Um mês depois haveria mais duas competições, uma em Lisboa e outra em Coimbra.