As participantes nos 50 km de Londres-2017. Fotos: RaceWalk Pictures/Philipp Pohle e Alamy Montagem: O Marchador |
O ano de 2017 ficará na história do
atletismo como aquele em que homens e mulheres passaram a dispor nos programas
dos campeonatos mundiais da modalidade do mesmo número de provas (24+24). Com a
inclusão dos 50 km marcha femininos, a equiparação ficou consumada, ainda que
com diferenças «de pormenor», como as alturas das barreiras, os pesos dos
engenhos de lançamento e o número de eventos nas provas combinadas.
A propósito do assunto, muitas vozes
surgiram a questionar se aquele era o momento adequado para que os 50 km marcha
femininos fossem objeto de atribuição de um título de campeã mundial, notando
que poucas mulheres têm experimentado a distância em competição, poucas provas
de 50 km têm sido destinadas a mulheres e poucos países (provavelmente nenhum)
atribuem títulos nacionais nessa distância para as mulheres.
Em sentido contrário houve quem
aplaudisse a iniciativa da Associação Internacional de Federações de Atletismo
(AIFA), vendo nela um passo no sentido do reconhecimento da igualdade de
direitos, conferindo a uma parte da população atlética uma oportunidade de que
dispunha apenas outra parte dessa população.
A decisão da AIFA foi anunciada pelo
seu presidente, Sebastian Coe, que numa conferência de imprensa realizada a 23
de Julho, informou também sobre as condições em que as atletas interessadas
poderiam ser inscritas e participar na prova em questão.
O momento da tomada de decisão pelo
Conselho da AIFA e a forma que terá decorrido o processo que levou à inclusão
dos 50 km femininos no programa dos mundiais de Londres foram aspectos
criticados no plano internacional. Por um lado, não se compreendia que uma decisão
desta importância fosse tomada e anunciada pouco mais de uma semana antes do
início dos campeonatos na capital britânica, tendo as federações nacionais dois
dias para inscrever eventuais interessadas. Por outro lado, estranhava-se a
forma pouco clara como o processo tinha decorrido, resultando numa decisão de
última hora que beneficiava claramente as envolvidas, em detrimento de outras
potenciais interessadas, que, confrontadas com uma decisão em cima do momento,
ficaram impedidas de preparar-se devidamente para uma competição que podia ter
sido estabelecida como objectivo de uma época caso tivesse sido anunciada com a
devida antecedência.
De pouco serviu Sebastian Coe ter
esclarecido que a decisão do Conselho vinha na sequência da participação de uma
atleta dos Estados Unidos (Erin Taylor-Talcott) na edição de 2016 dos Mundiais
de Marcha por Selecções (em Roma) e ter reconhecido que se tratava de uma
decisão de última hora, com base no pedido feito por um «pequeno grupo de
atletas». No final, o que ficou foi um processo opaco, cujos pormenores só aos
poucos foram sendo conhecidos.
Esta situação devia ter sido
evitada, acabando por deixar uma nódoa numa decisão positiva, que veio
equiparar o número de oportunidades de sucesso para homens e mulheres nos
campeonatos do mundo de atletismo, abrindo caminho para que outros níveis do
atletismo procedam de igual modo (competições continentais e nacionais e até
Jogos Olímpicos).
O futuro dirá se o sector feminino
adere ou não à distância longa de competição em marcha (é de admitir que sim) e
dará a conhecer os verdadeiros contornos do processo que levou á decisão. Em
todo o caso, para o bem e para o mal, a inclusão dos 50 km marcha femininos no
programa dos campeonatos do mundo de atletismo foi o acontecimento internacional
de 2017 no âmbito da marcha atlética.