quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Marcha em Portugal na Primavera de 1938 (III)

Pormenor da primeira página de «Os Sports» de 11/4/1938.
Provavelmente, Portugal nunca conheceu em publicações de âmbito nacional uma reportagem jornalística sobre uma prova de marcha como a que «Os Sports» dedicaram em 11 Abril de 1938 à prova que o próprio jornal levara a efeito na véspera, em Lisboa, integrada nas comemorações do 20.º aniversário do título. No dia em que o jornal passava de bissemanário a trissemanário, o destaque da capa foi para a vitória de Alberto de Sousa na marcha de 25 quilómetros que «Os Sports» tinham publicitado durante quase dois meses. Ao nome do atleta posto no título e ao início do texto juntavam-se nessa capa nada menos que seis fotografias de diversos momentos da prova, numa reportagem que tinha depois continuidade numa página interior.

Entre mais de quatrocentos inscritos, Alberto de Sousa, do Raio Lisboa Clube, triunfou com 2.37.51 h, tempo de que precisou para cumprir o percurso iniciado na Praça do Comércio e terminado no Parque Mayer, depois de passagens por Cais do Sodré, Pedrouços, Algés, Linda-a-Velha, Carnaxide, Estrada de Queluz, Calhariz de Benfica, Jardim Zoológico, São Sebastião da Pedreira, Praça Marquês de Pombal e Avenida da Liberdade.

O relato da prova revela que o domínio inicial coube a Manuel Guerreiro, atleta do Secil Clube de Outão (Setúbal) que, «em excelente estilo» se isolou ao fim de poucos quilómetros. Em Algés, Linda-a-Velha e Carnaxide, o seu avanço tinha estabilizado à volta de um minuto e 50 segundos. Iria manter-se na frente, isolado, até à passagem por São Domingos de Benfica (perto dos 20 km). Segundo o repórter, foi nessa altura que teve de ceder, depois de um esforço mal doseado e de os sapatos terem começado a magoar.

Era o momento em que Alberto de Sousa se adiantava, com o seu companheiro de muitos quilómetros, Ernesto Freitas, após ultrapassarem Manuel Guerreiro. A luta foi animada até perto do fim, sendo a vitória decidida no último quilómetro, com o ataque final de Sousa.

Concluindo uma prova em que os participantes tiveram sempre a companhia de numerosos ciclistas, além de automobilistas e motociclistas, Alberto de Sousa fez os metros finais em apoteose, sendo recebido no Parque Mayer pelo aplauso de centenas de espectadores, que, em traje formal de dia de festa, formaram alas para ver os marchadores.

A reportagem de «Os Sports» conclui-se com a publicação da extensa classificação final, englobando 219 atletas. Entre os participantes estavam nomes que à época eram já conhecidos da actividade atlética, ainda que, evidentemente, de disciplinas que não a marcha. Eram os casos do «sportinguista Joaquim Alvarez, que obteve um bom sexto lugar, fazendo um final de prova magnífico; Manuel Pereira (8.º), que representou o Grémio do Alto do Pina; Josefino Nunes (12.º), antigo corredor belenense e que ontem representou o Grémio Caramujo; Matos Henriques, já 'recordman' dos 1.500 metros, etc.»

Como curiosidade, aqui fica a lista classificativa dos dez primeiros:
1.º, Alberto Sousa, 2.37.51 h
2.º, Ernesto Freitas, 2.38.18 h
3.º, Armando Gonçalves, 2.38.28 h
4.º, Manuel Guerreiro, 2.39.04 h
5.º, José da Silva, 2.39.31 h
6.º, Joaquim Alvarez, 2.40.26 h
7.º, Joaquim Carvalho, 2.41.50 h
8.º, Manuel Pereira, 2.41.59 h
9.º, Joaquim Tavares, 2.42.30 h
10.º, António Henriques, 2.42.35 h

Apesar de ordenar os 219 atletas chegados, a classificação revela os tempos realizados apenas até ao 42.º lugar, obtido por Manuel Ribeiro, com 2.52.15 h.


Nas duas edições seguintes, o jornal iria fazer um balanço da prova em forma de reflexão e publicar uma nota biográfica sobre o vencedor, a que juntou uma nota sobre a festa feita na terra natal de Alberto de Sousa, o Bombarral.