Enquanto em Portugal «Os Sports» organizavam uma prova de 25 km, em França o «Le Petit Parisien» apoiava mais uma edição do Paris-Estrasburgo. |
Depois do primeiro
anúncio, em 18 de Fevereiro de 1938, da prova de marcha que levaria a efeito em
10 de Abril desse ano, o jornal «Os Sports» foi aguçando o interesse dos
leitores por essa competição fazendo alguma actualização informativa e
fornecendo pormenores técnicos para os não iniciados na marcha. Aliás, todos os
potenciais interessados na prova desconheceriam por certo a técnica de marchar,
atendendo a que quase de certeza não haveria praticantes de marcha de
competição em Portugal naqueles anos trinta do século passado.
Nas 14 edições do
jornal publicadas nas sete semanas seguintes, «Os Sports» divulgaram a prova de
marcha em dez números. Logo a 21 de Fevereiro declarava-se que a marcha era uma
especialidade «totalmente desconhecida das novas gerações». Terá sido com essa
consciência que se acrescentou, pouco mais adiante, que na competição marcada
para 10 de Abril não se exigia «marchadores impecáveis» nem se esperava
«'performances' de grande categoria». O objectivo era tão-somente «abrir caminho
para o futuro, despertar o gosto pela modalidade, tornar a marcha novamente
popular».
A falta de
conhecimento sobre a técnica da marcha levou alguns interessados a dirigir ao
jornal pedidos de esclarecimento sobre como se deveria marchar. A esses pedidos,
«Os Sports» começaram a responder através da publicação, iniciada em 7 de
Março, de dados regulamentares que ajudassem os leitores a perceber a técnica
da marcha de competição. Nesse dia, o texto de divulgação da prova referia a
dado passo: «Enquanto na corrida têm um momento em que estão no ar, na marcha
há sempre um pé que toca o solo. Não existe na marcha a chamada 'fase de
suspensão' da corrida.»
E prosseguia: «Na
marcha a perna é atirada para a frente, direita, e o calcanhar tocando o solo
antes do resto do pé. Mas convém notar que o facto de a perna avançar direita
não quer dizer que os movimentos do marchador sejam 'retezados'. Deve haver
sempre a maior ligeireza de movimentos, de maneira a evitar o mais possível a
fadiga.»
Outros pormenores
técnicos eram enunciados, relativos à altura a que o pé deve ser levantado, à
amplitude do trabalho dos braços ou à inclinação do tronco. Enfim, sempre havia
alguém capaz de servir de treinador (não de bancada mas de jornal) de
principiantes. Os mesmos pormenores técnicos foram sendo repetidos em edições
posteriores, num processo que seria rematado a 4 de Abril com a publicação de
uma fotografia de uma prova de marcha em França e com a seguinte legenda:
«Marchadores! Atentai na maneira de marchar do campeão francês Romens, três
vezes vencedor da prova Paris-Estrasburgo. Reparai, sobretudo, no seu movimento
de braços e na forma de lançar a perna. Quanto melhor o imitardes maiores
probabilidades tereis de alcançar a vitória na nossa prova do próximo domingo».
Nesta fase do
processo organizativo já se sabia a data e a extensão da prova. Faltava
determinar o percurso e proceder às inscrições. Estas, que eram gratuitas e
tinham de ser formalizadas junto da redacção do jornal, já começavam a chegar,
adiantando-se na edição de 18 de Março serem «algumas dezenas» e esperando-se
muitas mais. Nessa mesma edição era finalmente divulgado o percurso da prova,
que seguiria então o seguinte itinerário: Terreiro do Paço (partida), Cais do
Sodré, Avenida da Índia (5 km), Pedroços, Algés (8 km), Estrada da Maruja,
Sítio dos Ciprestes (10 km), Linda-a-Velha, Carnaxide, Estrada de Queluz,
cruzamento das estradas de Amadora-Sintra e Benfica (15 km), Avenida Coronel
Galhardo, Travessa Sargento Abílio, Calhariz de Benfica (20 km), Jardim
Zoológico, Palhavã, São Sebastião da Pedreira, Praça Marquês de Pombal, Avenida
da Liberdade, Parque Mayer (meta, 25 km).
Com o passar dos dias
iam chegando mais inscrições, cujo aumento ia sendo anunciado no jornal. Não
sendo pedido mais do que nome, idade, morada e, se possível, uma fotografia, a
25 de Março já se cantava sucesso com as «cerca de cem inscrições» chegadas à
redacção, feita secretariado da prova. Mas ainda a procissão ia no adro. A 28
de Março já se falava em «150 nomes nas inscrições», a 1 de Abril referia-se 18
clubes representados, a 4 de Abril já havia 210 marchadores, faltando apenas
dois dias para o fim do prazo de inscrição. Número final divulgado a 8 de
Abril: 405 concorrentes. No dia seguinte, o «Diário de Notícias» fazia eco do interesse
suscitado pela organização de «Os Sports» e actualizava para 410 o total de
inscritos.
Mas naquela última
edição antes da prova, «Os Sports» reservavam a última página quase por
completo para o grande evento de domingo. No pós-título recordava-se o percurso
e marcava-se a partida para as 8h00 da manhã. Entre muitas informações úteis
para os interessados em participar e em acompanhar a prova, eram identificados
os «postos de reabastecimento de 'Ovomaltine'», elencava-se os prémios e
divulgava-se a lista dos nomes dos inscritos. Tudo magnificamente ilustrado por
duas montagens fotográficas, cada uma com mais de cinquenta retratos de
concorrentes aos 25 km de marcha.
Estava tudo a postos.
Faltava apenas que soasse o tiro de partida.