Nova Iorque marcou a estreia da seleção nacional em Taças do Mundo de Marcha e constituiu, de facto, um marco histórico para a mais jovem disciplina do atletismo português, implementada no nosso país em finais de 1974.
Após 12 anos trilhando muitos caminhos e obstáculos, a marcha atlética atingia maturidade e iria medir forças na presença de seleções nacionais com fortes tradições na especialidade. Atletas de renome mundial entre os quais, Carlos Mercenário, Ronald Weigel, Hartwig Gauder, Maurizio Damilano, Olga Krishtop, contavam-se entre os presentes.
O evento, que já ia na 13.ª edição, assinalava também, e curiosamente, a sua estreia em palcos não europeus, mais propriamente no Central Park da cosmopolita Nova Iorque, com a participação de atletas de 36 países.
Difícil foi, contudo, o caminho traçado até se pisar solo americano. Alguns incidentes e polémicas nortearam os meses antecedentes à participação portuguesa na competição. Numa primeira decisão, a menos de um mês da prova, a Federação Portuguesa de Atletismo negou a inscrição da equipa argumentando não estarem reunidas as condições que justificassem uma participação condigna e que os motivos invocados pelo então DTN teriam sido insuficientes.
De imediato, a Comissão Nacional de Marcha, que tomara conhecimento da decisão através de um comunicado difundido à imprensa, reuniu de urgência, a seu pedido, com a direção da FPA a qual, perante a apresentação de novos argumentos, deliberou unanimemente pela participação do selecionado luso, se bem que apenas no setor masculino.
Com a colaboração da CNM encetaram-se então contactos com os atletas, entre os quais Francisco Reis, residente em Inglaterra. A comitiva, chefiada pelo dirigente federativo Artur Madeira e enquadrada pelo técnico nacional de Marcha, Adriano Pereira, lá seguiu viagem rumo aos EUA, onde, apesar de tudo, os resultados foram satisfatórios.
Participaram nos 20 km, José Pinto (30.º), José Urbano (38º), Hélder Oliveira (48.º), e Francisco Reis (67.º), e nos 50 km, Carlos Albano (67.º), José Gonçalves (71.º), Jorge Esteves e José Pinto, que desistiram.
Carlos Albano, atleta pioneiro, então com 42 anos de idade, teve aí – chamemos-lhe assim - o seu prémio de carreira e foi o melhor atleta português nos50 km, traça-nos, em algumas linhas, a experiência então vivida, passados 25 anos:
“Um orgulho enorme. Deslumbrante. Assisti a competições de altíssimo nível e nunca imaginei que se pudesse marchar a tais ritmos. Em Portugal, nesses tempos, a especialidade ainda não era bem vista e merecia mesmo o desprezo em alguns setores do atletismo. Moniz Pereira, por exemplo, era contestatário assumido. Ora, nós ao vermos, em Nova Iorque, que as grandes potências mundiais do atletismo marcavam presença no evento pensámos…bem, isto não é brincadeira nenhuma…”
Albano salienta, ainda, os momentos muito especiais por que passou: quando as comitivas foram recebidas no edifício da ONU, quando foi ele o escolhido para ser o porta-bandeira da seleção portuguesa e quando, na própria competição, se sentiu sempre muito bem. “Foi ótimo. Marcou-nos muito positivamente, nenhum de nós foi desclassificado e os próprios dirigentes passaram a olhar com outros olhos para a especialidade”.