sábado, 12 de abril de 2025

Comité Olímpico Internacional e federação internacional de atletismo dão mais uma machadada na marcha atlética

Montagem: O Marchador

O mundo olímpico rejubila com a decisão tomada esta quarta-feira, 9 de abril, pelo Conselho Executivo do Comité Olímpico Internacional em relação ao programa desportivo dos Jogos Olímpicos de Los Angeles de 2028, nomeadamente no que se refere às questões da participação feminina, do aumento de número de provas e do consequente acréscimo da quantidade de medalhas a atribuir – tudo isso sem mexer no limite de 10.500 atletas participantes. O panorama parece idílico, mas os mais atentos e mais próximos da marcha atlética aperceberam-se da exclusão de uma prova de marcha e da mudança da distância das outras duas provas da especialidade que faziam parte do programa olímpico.

Na prática, tratou-se da eliminação da prova de estafeta mista na distância da maratona em marcha atlética e da substituição das provas masculina e feminina de 20 km por provas na distância igual à da meia-maratona.

Como é fácil perceber, trata-se da continuação do ataque às distâncias que de há muito se impuseram como matriz das grandes competições de marcha atlética. Com pequenas exceções, os 20 km e os 50 km foram durante praticamente um século as distâncias das provas de marcha nos Jogos Olímpicos e nas grandes competições mundiais e continentais de atletismo.

Nos Jogos de Paris de 2024 consumou-se a retirada dos 50 km, dando lugar a uma estafeta mista de dois atletas cumprindo quatro percursos, para totalizar a distância igual à das corridas de maratona. Já antes, a mesma distância tinha sido eliminada dos programas dos mundiais de atletismo, dando lugar a competições de 35 km, onde prevaleceram (e isso é muito significativo) os mesmos atletas que se impunham nas provas de 20 km dos mesmos campeonatos.

Na verdade, a prova de estafeta mista não deixou saudades, não só porque vigorou em apenas uma edição dos Jogos Olímpicos mas também porque se tratava de uma competição sem qualquer implantação no mundo da marcha, onde nunca houve tradição nem de provas de estafetas, nem de provas mistas, nem de provas em que os atletas entravam e saíam competição durante uma mesma prova. De facto, nada disto fazia sentido e, com o devido respeito por quem se preparou para participar e participou de facto nessas provas olímpicas, foi muito bom que o programa tivesse sido expurgado desses furúnculos. O único problema é que não se repôs a situação anterior (regresso das provas de marcha mais longas, como acontecia com os 50 km desde os Jogos Olímpicos de Los Angeles de 1932), limitando-se a decisão a um acto de corte.

Agora, a caminho dos Jogos de Los Angeles de 2028, exclui-se a estafeta mista, que não dá lugar a outra competição, ao mesmo tempo que se acaba com as provas de 20 km, adoptando em seu lugar as provas de distância igual à da meia-maratona (21,097 km). Na verdade, também ninguém percebe qual a vantagem de substituir uma prova de 20 km por outra de 21 km.

Este é, por isso, um novo passo num percurso iniciado há um punhado de anos com a exclusão, primeiro, das provas de 50 km e, depois, sucessivamente, das de 35 km e da tal estafeta-maratona. Só que, desta vez, o processo tem uma agravante, que resulta da circunstância de a retirada de uma prova de marcha do programa olímpico não ser «compensada» com a inclusão de outra.

Porventura, o caso poderá ter alguma relação com a invenção da prova de estafeta mista de 4x100 m, competição que passou a fazer parte do programa de atletismo dos Jogos Olímpicos. O mesmo é dizer que se eliminou uma das três provas de marcha do programa olímpico para acrescentar uma quinta corrida de 100 metros – já havia os 100 m masculinos e femininos e a estafeta 4x100 m também nas vertentes masculina e feminina, juntando-se agora a nova estafeta com dois homens e duas mulheres.

Este procedimento hostil para com a marcha atlética vem de muitos anos atrás, vem do tempo em que alguém começou a fazer germinar a ideia da adoção de distâncias como as da maratona e da meia-maratona nas provas de marcha (espécie de sonho pessoal ou grande desígnio de vida de quem quis subir na estrutura decisória da marcha e do atletismo, mas sem se preocupar verdadeiramente com o desporto. Parece inquestionável que o único critério para estas decisões se relaciona com a criação de um campo de experiências, mas sem se perceber para onde caminhamos.

Esta sucessão de mudanças que parece não ter fim traduz apenas a desorientação dos agentes perpetradores das tropelias. Torna-se evidente que, tanto da parte de quem propõe como da parte de quem decide, ninguém tem a menor ideia de para onde se vai. Cada nova alteração constitui mais uma experiência – e apenas isso. Pode ser que, no meio do caos assim criado, alguém consiga algum proveito pessoal, mas não se vislumbra qualquer vantagem colectiva nem qualquer benefício para os atletas, os treinadores, os juízes ou os organizadores de provas de marcha.

Afinal, que objetivos se persegue com estas decisões?

Que estudo prévio foi feito para fundamentar as propostas de alteração das distâncias olímpicas da marcha?

Que consulta foi feita aos atletas e aos treinadores da marcha?

Que envolvimento foi proporcionado ao mundo académico que estuda o fenómeno desportivo e, em especial, o atletismo?

Que enquadramento têm estas medidas na história da marcha atlética?

Que modelo competitivo se deseja para o atletismo e mesmo para os Jogos Olímpicos?

Que perspetivas podem ter os atletas (em especial os praticantes de marcha atlética) num contexto de tão grande variabilidade do quadro competitivo?

Que ponderação houve para estas mudanças constantes?

Que garantias pode haver de que não vão existir novas mudanças a curto ou médio prazo?

Quando é que isto vai parar?

Que destino dar aos responsáveis por estes desmandos?